O relatório preliminar da medida provisória (MP) que criou o Programa Desenrola traz uma novidade importante: a imposição de um teto para os juros do rotativo do cartão de crédito. De acordo com o parecer do deputado Alencar Santana (PT-SP), relator do texto, as instituições financeiras terão 90 dias para apresentar uma proposta de autorregulação. Caso contrário, o limite imposto será de 100% do valor original da dívida.
Embora o parecer oficial só seja apresentado na próxima terça-feira (29), o deputado disponibilizou uma versão preliminar do relatório. Além da limitação dos juros do rotativo, outra medida polêmica incluída no texto é um teto para os juros do parcelamento de faturas no cartão. Segundo dados do Banco Central, em junho, os juros do rotativo chegaram a 437% ao ano, enquanto os juros do cartão parcelado ficaram em 196,1% ao ano.
Conforme o parecer preliminar, o limite para os juros do rotativo também será aplicado às instituições financeiras que não aderirem à autorregulação. Durante esse período de 90 dias, contados a partir da publicação da lei no Diário Oficial da União, os emissores de cartões de crédito deverão submeter a autorregulação ao Banco Central e ao Conselho Monetário Nacional (CMN).
Caso as medidas iniciais não sejam aprovadas dentro desse prazo, o substitutivo proposto pelo deputado prevê que o valor total cobrado em juros e encargos financeiros não poderá ultrapassar o valor original da dívida. Alencar Santana explicou que se inspirou parcialmente no modelo britânico, no qual a dívida total renegociada não pode exceder o dobro do valor principal: 100% da dívida original mais 100% de juros.
O deputado apresentará um substitutivo que unifica três projetos de lei voltados para a facilitação do acesso ao crédito, além da MP 1.176/2023, que criou o Programa Desenrola. Editada em junho, a MP perderá a validade em outubro e provavelmente não será votada pela Câmara devido às divergências com o Senado em relação à instalação de comissões mistas.
A definição desse limite para o rotativo e para o crédito parcelado vem sendo discutida por um grupo de trabalho formado por bancos, a indústria de cartões e o comércio. No início do mês, o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, gerou polêmica ao afirmar que o órgão estudava o fim do rotativo do cartão de crédito.
No mesmo dia, a Federação Brasileira dos Bancos (Febraban) emitiu uma nota defendendo uma solução construtiva que poderia incluir o fim do crédito rotativo e uma reformulação das compras parceladas no cartão. Cerca de dez dias atrás, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, destacou que o consumidor não pode ser prejudicado pelo fim do parcelamento sem juros, que representa cerca de 70% das compras no comércio.
A Febraban atribui ao parcelamento de compras sem juros, modalidade criada no Brasil, a distorção nas taxas para as demais linhas do cartão de crédito, pois cria uma espécie de subsídio cruzado, em que os consumidores adimplentes acabam cobrindo os custos dos inadimplentes por meio de tarifas mais altas. No entanto, bancos menores e algumas fintechs (startups do setor financeiro) discordam dessa visão e afirmam que a alta dos juros é resultado da concentração de mercado e da falta de competidores no setor financeiro.